terça-feira, 19 de novembro de 2019

Gato escondido com o rabo de fora


Numa altura em que vários assuntos relacionados com a Educação estão na ordem do dia e em que se fala de indisciplina mais do que nunca, como se toda a gente tivesse "acordado" agora para um problema que tem décadas, continua a fazer-me confusão a grande quantidade de professores que reage sempre como se isso fosse apenas um problema dos outros, recusando-se a admitir ter problemas de indisciplina na sua sala de aula, como se confessá-lo fosse assumir publicamente uma qualquer espécie de fraqueza, uma inferioridade que os debilita como profissionais e como pessoas.
Gabam-se, então, de nunca ter posto alunos na rua, ou nunca ter tido qualquer problema com os alunos, como se isso os engrandecesse face aos seus pares. É este tipo de comportamento, muito comum mesmo nas reuniões de conselhos de turma ou outras, o silenciamento de muitos casos por medo, pudor, encolher de ombros, gabarolice ou seja lá o que for, que leva depois os responsáveis a referir problemas de indisciplina "residuais", quando quem está nas escolas sabe que a realidade não é de todo essa.
É, de certo modo a isto que se refere o testemunho da professora Carmo Machado na "Visão" do dia 11 deste mês, que diz, por exemplo o seguinte:
Também eu já fui injuriada. A minha experiência profissional com três décadas de escola pública mostra que os alunos dos cursos profissionais são, em regra, mais indisciplinados do que os alunos dos cursos do ensino regular e que os do ensino básico provocam mais problemas que os do secundário. Porém, é tudo uma questão de sorte. Já me chamaram "filha da puta". Já entraram e saíram da sala com estrondo, aos pontapés e aos palavrões. Já me ameaçaram. Já amarrotaram e rasgaram testes corrigidos, atirando-os para o caixote do lixo, ali mesmo à minha frente. Todos os dias, dia após dia, há professores a passar por alguma situação de violência. São actos contínuos que vão corroendo a mente e o corpo. Num dia normal de trabalho, um professor lida com cerca de 90 a 120 alunos. Todos diferentes, sim! Mas também todos iguais na sua adolescência, na sua atribulada vida familiar, no seu (des)interesse pela escola, na sua (des)preocupação com as notas, na sua obsessão pelo telemóvel, na sua descoberta da sexualidade, na sua atitude de revolta.
Não adianta fingir. Ninguém está imune. Acontece com todos, mesmo, ou até sobretudo, com os que dizem que não.
E da mesma maneira que não aguento debates sobre Educação, onde os professores fazem sempre tristes figuras, enchendo a boca com os seus "projectos de sucesso", a sua "excelência" e a sua "missão", mascarando a realidade apenas "para ficar bem na fotografia", não tenho qualquer pachorra para este discurso do "comigo não é assim", porque "eu sou excelente".